Na tarde de segunda-feira dia 11 de março de 2013, este era
o tempo de espera na emergência do Complexo Hospitalar Santa Casa de
Misericórdia de Porto Alegre para convênios e particulares. Se não há risco aparente de morte ou
convulsões, você pode esperar até 10 horas pra ser atendido por um médico.
E tudo está funcionando! Nenhuma falta de funcionários ou
médicos. É a demanda que está enorme. Muita gente vinda de todas as partes do
estado.
Para convênios ou particulares, de acordo com a urgência, um
leito pode demorar vários dias pra ser liberado a quem espera enquanto recebe
atendimento na emergência (sentado em sala de medicação ou em macas na
observação). O atendimento é recebido, os funcionários são educados, fazem o
que podem. Mas as filas pra leito ou exames são enormes.
Normalmente sabemos destas dificuldades, mas encará-las de
frente é bem mais complicado. Tem horas que dá vontade de sacudir alguém,
gritar, sei lá.
Nesse mar de intranquilidade na área da saúde, as pessoas são
a parte mais delicada e importante de tudo.
Aos poucos fica-se por dentro da rotina do hospital, sabe-se
os horários dos plantões, nomes dos funcionários, como cada coisa funciona. Cumprimentam-se
familiares de pacientes em situação semelhante que vemos todos os dias e com
quem aprendemos a conversar. Mesmo alguns “de passagem”, que ficam apenas
algumas horas. Desvendam-se os labirintos de corredores brancos e entre
esguichos de álcool, copos de café e água, experimentamos todos os bancos,
cadeiras, ângulos de visão e observamos.
Não a televisão cujo tubo de imagem está tão cansado que
parece a ponto de estourar. Observamos as pessoas que estão, as que vêm e vão. Os
que lá trabalham e os que chegam em busca de ajuda.
Desde o final de semana, quando chegamos, observamos as “ondas”
de pacientes. Nunca fica ‘vazio’, com menos de 15 pessoas na sala de ‘espera’ da
emergência. Há um contador que deveria sinalizar as senhas chamadas; por algum
motivo não funciona –parou no 933 e não foi desligado- e estas senhas são distribuídas em papel
anexadas aos documentos do paciente que passará (dependendo da necessidade com
1 acompanhante) à sala seguinte para triagem (quando alguém checará sinais
vitais e primeiras questões pra levar ao médico).
Quem fica do lado de fora nada sabe além das mensagens de
celular trocadas entre um lado e outro. Até onde observamos, os funcionários são
atenciosos, os médicos realmente interessados e até hoje não ouvi alguém dizer
a palavra “virose”, uma das piadas prontas de quem precisa de atendimento médico.
Aliás, as piadas ficam por conta daqueles que, como nós,
esperam alguma coisa do lado de fora, quando ouve-se por exemplo a frase “é só
esperar chamar”. Quando batemos a marca das primeiras 24h cantarolei o tema da
vitória de Airton Senna. Não sabemos os nomes uns dos outros – estranho isso – apenas
“apelidos” ou o nome do paciente como referência. Do mesmo jeito que se dá
referência às pessoas que encontramos na rua passeando seus bichos de estimação:
a “mãe” do terrier amarelo, essas
coisas, sabe?
Trocamos informações, alcançamos lenços de papel, carregador
de bateria de celular, cuidamos se alguém chama enquanto o outro vai no banheiro
ou na cafeteria. Uma comunidade estranha se forma. Comunidade daqueles que,
como seres humanos, se ajudam e se amparam. Ficamos preocupados pois já sabemos
da notícia que determinado familiar terá ao chegar e nos emocionamos com ele.
E na aparente indiferença dos funcionários percebe-se a
necessidade vital de autopreservação. Premissa básica para continuar a trabalhar
num ambiente assim.
Vê-se também exemplos como o do funcionário Sergio, que
vimos ontem pela primeira vez. Delicadeza, determinação, paciência,
boa-vontade, competência ímpares! Ao chegar, a confusão era muita. Do lado de
dentro, ocupando lugares, pessoas que deveriam estar fora. Outros que deveriam
estar na traumatologia. Gente exigindo atenção. Desde pessoas que apenas
precisavam falar com alguém ‘dentro’ até pessoas que chegavam em situação grave.
Ele ia medindo as necessidades, rapidamente e com toda a educação e calma do
mundo reorganizou tudo. Encaminhou cada pessoa pra onde de direito. Ao fazer
isso, elevava ligeiramente a voz pra ser ouvido por todos, explicava detalhada
e pausadamente uma única vez, todo o procedimento – fosse de atendimento ou
visita e a cada pessoa atendia com toda a atenção do mundo! E a calma e o silêncio
aos poucos foram restabelecidos no recinto.
Era apenas isso que as pessoas queriam: atenção, respostas,
carinho.
E enquanto ele atendia alguém os demais esperavam, pois
sabiam que receberiam o mesmo cuidado.
Pra este senhor, eu certamente tiro o meu chapéu.
Alguns momentos de descanso antes de voltar pro meu “turno”
e a visita das 22h na ala da emergência, torcendo pra que hoje consigamos um
quarto.
Isso é o que acontece num país onde é mais importante
construir estádios de futebol que hospitais e aparelhá-los.
Tenho até medo de mostrar na outra ponta do complexo como
está a área do SUS.
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