Antiga discussão: o que a arte nos traz ou faz?
O que uma sessão de cinema pode nos faz pensar?
Ainda no meio da estréia de “Colegas” já estava sentindo e pensando em como
escreveria sobre tudo que aflorou na minha consciência naquele momento. Quase
toda oportunidade que tive na vida de contato com pessoas com alguma
deficiência física, Síndrome de Down ( ou deveria ser “up”, Marcelo
Galvão?) vieram de contatos
profissionais, geralmente eventos em que trabalhei e em muitos deles havia um
objetivo em comum: inclusão. E sempre foi instrutivo, divertido, esclarecedor e
inclusivo pra mim! Eu era incluída nas brincadeiras de esconder a muleta de um, em ir dançar com o cadeirante ou escolher um lugar bem na frente pro deficiente visual "ver melhor".
Daí que fiquei pensando: não deveria ser REinclusão? Por
que, em algum momento estas pessoas que sempre estiveram aqui começaram a ser
separadas das outras ditas “normais”, não?
É só olhar entre os animais. Temos um cachorro que levou um
tiro e perdeu uma das patas dianteiras ainda com 6 meses de vida. Em poucas
semanas ele já estava novamente aprontando das suas e completamente reintegrado
a seu cotidiano entre outros cachorros e animais diversos. Não mudou quem ele
era, nem como o tratavam. Só nós, humanos, ficamos ainda um bom tempo pensando
nele como o diferente, o coitadinho.
Em oportunidades como a sessão acessível do filme “Colegas”
encontro amigos que trabalham em prol da tão falada inclusão e com verdadeira
paixão com pessoas que não sei como uma parte de mim via como diferentes.
Vasculhando a memória tentei encontrar os momentos na minha infância em que
ouvi pessoas dizerem “tadinho, é doentinho”, “ah, coitada, ela tem um filho que
é doente mental”. Acho que esse universo à parte, criado dentro da sociedade em
que vivemos, foi quem colocou em alguma parte de mim alguma estranheza. Quem
teve oportunidade de ler “O Filho Eterno” de Cristovão Tezza ou ver a peça adaptada
do mesmo sabe o que é assumir essa predisposição a fugir do diferente.
Estranheza que vai por água abaixo quando encontro algum
conhecido em alguma destas situações ditas “especiais”. Por que somos todos
seres humanos. Uns negros, outros caucasianos, outros albinos, asiáticos, com
um dedo ou perna a menos, alguém – como eu – com deficiência visual. Sim, sou
diagnosticada com deficiência visual desde os 2 anos de idade e uso óculos
praticamente toda minha vida e agora vai piorando com a idade – outro motivo de
sectarização. Muito tempo isso causou estranheza, as pessoas sentiam vergonha,
era motivo de letra de música e gozação. Hoje é moda usar óculos de grau com
armações de todo tipo e até mesmo quem não precisa quer usar só pra fazer “tipo”,
afinal, estão até nos editoriais de moda!
Não tenho nenhuma autoridade pra falar no assunto de modo a
transformar numa pesquisa, mas fico muito intrigada com o ser humano. No que um
deficiente visual é menos capaz que qualquer outra pessoa no desenvolvimento de
trabalhos diversos que não impliquem, logicamente, ao uso dessa faculdade? Marçal Souza já era um grande produtor quando
perdeu a visão e talvez isso tenha aberto novas oportunidades e revelações a
ele. Agora produziu o filme “Colegas” com a mesma competência de sempre. No que
um deficiente auditivo é menos competente na finalização de um trabalho
gráfico? Ou um cadeirante menos ‘feroz’ pra fechar um grande negócio?
Nos últimos anos vemos um esforço tremendo da sociedade
através de regras, regulamentos e relações institucionais de empresas que vêem
como positivo pra sua imagem a inclusão de pessoas com deficiências e não como
a contratação de pessoas competentes e ponto. Tem seu lado positivo, claro,
pois é através dessas ações que, espero, chegaremos logo a uma sociedade em que
não precisaremos olhar, ouvir, caminhar, pensar da mesma forma pra que
lembremos de uma premissa básica que nos une: amor. Não é pra soar piegas. É a
verdade. Não há idioma maior pra unir pessoas e por que nos parece tão difícil?
Deficiente, pra mim, é aquele incapaz de ver o outro como um
igual pois lhe falta amor.
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